Resenha do Cd No Gods No Masters / Garbage

NO GODS NO MASTERS title=

NO GODS NO MASTERS
GARBAGE
2021

BMG
Por Thais Sechetin

Se o Garbage é considerado como os rebeldes dos tempos do grunge, se eles só lançam discos sem pressão e sem a necessidade de fazer um som pop para agradar, em 2019 eles se afastaram mais ainda da vida comum por aproximadamente duas semanas em Palm Springs para produzir o que hoje é na minha opinião o melhor trabalho da banda (o segundo melhor, se considerar o valor sentimental o primeiro álbum). Em “No Gods No Masters'', as letras surgiram da necessidade de retratar o mundo caótico em que vivemos. E o fato dele só ser lançado agora, em junho de 2021, mostra que ele foi lançado no momento certo para falar sobre sociopolítica e podres da sociedade como sexismo, racismo, egoísmo e os diferentes tipos de abuso cometidos por quem se encontra ou se acha mais poderoso que alguém.

Este é o sétimo trabalho do Garbage, e de acordo com a vocalista Shirley Manson, o número 7 é simbólico, assim como é para algumas vertentes ocultistas. Novamente, não há momento melhor pra banda retratar o caos e fazer um disco com uma direção única e um argumento. O recado foi direto: críticas sociais explosivas, raiva, sarcasmo e escuridão embalados em batidas,melodias e efeitos soturnos, que fizeram do álbum um trabalho eclético: ora sombrio, ora pulsante, ora groovado, ora melancólico, ora dançante, ora assustador.

Um álbum embasado em severas críticas é fio de esperança para um Rock que hoje possui tantos representantes que nos decepcionam: Na terra em que alguns fazem declarações racistas, sexistas e atualmente até negacionistas, Shirley Manson arquitetou uma forma de refazer a história da Arca de Noé, o que se tornou a faixa de abertura do disco. A letra de “The Man Who Rule The World” sugere salvar os idosos, crianças e animais enquanto os homens que só fizeram bagunça ao governar o mundo que se danem. Sua letra fala sobre ganância, capitalismo,sexismo, egoísmo e ignorância.

O álbum também tem uma referência forte ao pós-punk e algumas bandas específicas:o baterista Butch Vig cita o Roxy Music e o New Order como as maiores referências do álbum, embora elas não sejam tão perceptíveis na hora de ouvir. Mas se prestarmos atenção em faixas como “This City Will Kill You“ e “Flipping The Bird”, pegamos algumas referências sonoras, sem contar a faixa título que é praticamente um sample do Devo e é a minha favorita do disco.

O novo trabalho do Garbage conta com um lado sombrio, com som industrial e toda a colaboração da música eletrônica e efeitos sonoros: “Waiting For God”, em todo seu tom soturno é um apelo desesperado para que um Deus apareça e venha nos salvar. A letra, que é forte, diz: “Enquanto meninos negros levam um tiro nas costas/ Eles foram pegos andando de bicicleta?/Ou é culpado de andar sozinho?”.Este é um claro manifesto de repúdio à realidade que vivemos em países racistas e de policiais truculentos. “Woman Destroyed” também é composta por uma melodia soturna e a letra fala sobre uma possível vingança por um relacionamento abusivo. E é legal perceber que na música, quando as ameaças e os planos de vingança iniciam, também ocorre uma virada instrumental, mais incisiva e agressiva.

“Uncomfortable Me” também faz a linha melodiosa e introspectiva. Também é uma referência à Roxy Music e poderia ser um single, embora a banda não tenha ainda experimentado singles com melodias mais suaves para tal fim...Mas não se enganem: a suavidade da faixa está apenas na melodia.

Mas como dito de início, nem só de agressividade e morbidade se sustentará o lado eclético de No Gods No Masters. No disco você pode conferir sons mais dançantes, batidas de pista como em “The Creeps”, que exagera nos sintetizadores, sendo outra referência pós- punk. Já em "Godhead'' existe um riff de guitarra feito por Steve Marker que faz soar como o Nine Inch Nails. A letra de “Wolves” mais parece uma redenção resultante de uma visita ao passado de Manson junto com a famosa fábula do Lobo: “A qual dos meus dois lobos darei minha atenção esta noite?/ Qual vou decidir alimentar?/Contra qual vou decidir lutar?”

E como uma forma de explorar o tema liberdade sexual, é em “Anonymous XXX” que se explora todos os efeitos e sussurros possíveis para interpretar uma letra repleta de erotismo, dando um certo descanso aos temas políticos. Será? Afinal de contas, hoje em dia liberdade sexual também é uma discussão ideológica e política, assim como a religiosidade e o falso moralismo de algumas vertentes cristãs claramente expostas na faixa título “No Gods No Masters”.

E como se “No Gods No Masters” já não bastasse por si, o álbum foi lançado junto com uma edição Deluxe de mais oito faixas. De acordo com o Butch Vig, esta é uma maneira do Garbage experimentar as novas formas de lançar um disco, já que o mercado da música mudou muito e rápido nos últimos anos. Nesta edição de aproximadamente 40 minutos a mais, a banda relançou alguns singles já conhecidos pelos fãs como "Girls Talk”, com a participação de Brody Dalle e o cover de “Because The Night”, da Patti Smith e do Bruce Springsteen, com a participação da banda “Screaming Females”. E a minha favorita de todo o trabalho lançado, um magistral cover de Starman, do Bowie.

Resenha Publicada em 26/06/2021





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