Resenha do Cd Querem Acabar Comigo, Roberto / Karine Alexandrino

QUEREM ACABAR COMIGO, ROBERTO title=

QUEREM ACABAR COMIGO, ROBERTO
KARINE ALEXANDRINO
2004

TRATORE
Por Lazaro Cassar

Pense em todos os termos que você está cansado de ouvir quando se trata de analisar o trabalho de um músico-compositor atual que foge de certos esquemões radiofônicos: “ruptura”, “iconoclastia”, “miscelânea”, “desconstrução”, “reinvenção”, etc.

Pense em todos os artistas aceitos pela dita intelligetzia que adora essa faceta cool-hype-etérea da música; artistas esses que optam por um olhar de mundo que busca constantemente se explicar através de referências tropicalistas, setentistas; de low profile cansado (em que até o suposto “descompromisso” é algo minuciosamente burilado, vide algumas entrevistas de artistas tidos pela intelligentzia como neo-outsiders tentando emular a simplicidade outrora legítima de um Dorival Caymmi, posando de bermudinha, barba por fazer e sorriso de “manhã de domingo preguiçosa”) deixando de lado a visceralidade, o elemento fenomenológico, sanguíneo (o homem participante das experiências no mundo, e não mero observador dos participantes de tais experiências, como o “roqueiro” Caetano de “Cê”).

Em suma: pensemos em legitimidade.

Karine Alexandrino lançou seu “Querem acabar comigo, Roberto” há cinco anos. Um álbum ouvido por poucos e compreendido por menos ainda; não há aqui as tradicionais emulações (tropicália, Gal, 70’s, bossa-nova, sambinha, macumbelês) nem a pedante postura indie de quem afirma coisas como “Claudinho e Buchecha são dois pássaros em cântico uníssono com o povo, ou Chimbinha é a síntese da mescla do...” ah, toda essa pasmaceira.

Começo pela voz, que possui uma estética própria, sem nenhum referencial (explícito) anterior. A música causa grande estranheza mas não se sabota, ainda quer fazer suar, chorar, identificar, emocionar, arrepiar, etc. O cool aqui não entra (daí o Robertão do título); a balada beatle “Mulher Ioiô”, que abre o álbum, é tudo, menos êmulo de 60’s; é algo novo, cujo suposto antecedente mais aponta para o futuro que para o passado. “Kiss Kiss Kiss”, da Yoko, poderia ser só mais um “resgate pitoresco de artistas de quem menos se espera”, como tantos outros fazem, mas é um cruzamento (desculpe, me rendi a um daqueles termos) originalíssimo de Ennio Morricone e música brega; “Amor e glória é só boato” tem uma das introduções mais geniais e lindas já cometidas em nossa música (um sintetizador que parece um Kraftwerk pop, oitentista, que, por si, vale a canção – bela, por sinal); a regravação de “Dio come ti amo”, que cheira a prostíbulo dos anos 70; o dance “Loca pos ti”, descaradamente dançante, etc. Não, não há por aqui produção de Kassin, Domenico, e participações de Tulipa Ruiz e Céu: isso seria a perpetuação de tudo o que foi dito no início do texto.

Um álbum para poucos (e, repito: que não negligencia a vitalidade da música), de uma artista que nunca encontrará o retorno da massa, porque, além de inclassificável, não busca a “inclassificação” como um rótulo para seu trabalho.

Resenha Publicada em 18/04/2011





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