Resenha do Cd Detroit Stories / Alice Cooper

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DETROIT STORIES
ALICE COOPER
2021

EAR MUSIC
Por Thais Sechetin

Se alguém cultivava esperanças de um dia ouvir um álbum de Alice Cooper que não beirasse à loucura, esse alguém amargou uma grande decepção ao ouvir Detroit Stories. O álbum é uma verdadeira massaroca de subtítulos e adjetivos desde as músicas lançadas e assuntos abordados nas letras, passando pelos estilos musicais explorados e terminando na quantidade de músicos convidados. Mas todos esses elementos têm uma linha de chegada em comum: Celebrar Detroit, a cidade natal de Alice Cooper, que também foi cidade do Rock que não queria saber de paz e amor.

Com a produção do amigo e produtor de vários outros trabalhos de Alice Cooper, Bob Ezrin, Detroit Stories é dividido em três partes: Músicas inéditas, músicas contidas no EP Breadcrumbs, de 2019 e covers homenageando artistas de Detroit. Conta com a participação de vários artistas da cidade, como Wayne Kramer, do MC5, Johnny “Bee” Badanjek, os músicos do Motor City Horns e membros da extinta Alice Cooper, a banda original. E pra finalizar, o álbum foi gravado no charmoso Rusbelt Studios, claro, também em Detroit.

Uma das faixas mais legais e que foi perfeita para começar os “contos detroitianos” é o cover de “Rock & Roll”, do Velvet Underground, o primeiro single lançado em uma sexta feira 13, em novembro de 2020. Outro destaque é “Go Man Go”, que faz parte das músicas lançadas em Breadcrumbs e tem um ritmo punk, lembrando o Iggy Pop. E a trilogia inicial do disco fecha com outro cover, surpreendente, de uma banda de Garage Rock formada nos anos 2000 chamada Outrageous Cherry. Independente da massaroca musical, vale ressaltar que a banda também é de Detroit.

“Social Debris” é um Hard Rock que presta homenagem às bandas da época em que a Alice Cooper Band dava seus primeiros passos. “ $1000 High Heel Shoes”, a faixa seguinte, dá outro ritmo para o álbum, relembrando os grandes nomes da Era Disco da década de 70 e contando com a participação especial nos vocais de Sister Sledge.

“Hail Mary” é um rock basicão, talvez até desnecessário no disco, e logo depois a gente segue sem novidades, pois a faixa “ Detroit City 2021” apenas ganhou um nome novo. A outra versão , “Detroit Stories 2020” também está no Breadcrumbs, embora seja um bom Rock e uma homenagem bem coerente à toda cena da cidade. “Drunk In Love",uma das inéditas, é um Blues rasgado, bastante tradicional e amargo, como todo bom Blues deve ser.

É interessante ressaltar a versatilidade que Alice possui até na hora de fazer deboche: “Independence Dave” é uma música de ritmo bem divertida ,com uma linha de baixo bem elaborada, gaita e bateria acelerada na introdução que depois vira um Rock à moda “Johnny B. Goode”.

“I Hate You”, a princípio, parece ser dispensável no disco. Também pudera, é uma faixa confusa, cheia de vocais, alguns bem caricatos e com uma letra que parece ser escrita por e para adolescentes. Mas a boa surpresa temos ao saber que é ela quem conta com a participação dos antigos membros da Alice Cooper, a banda original. E sim, na música eles estão na verdade tirando sarro uns dos outros!

Já "Wonderful World” é outra faixa inédita que flerta muito com o Blues, mesclando com o Rock teatral de Alice, embora não empolgue muito, e “Sister Anne” é um cover do MC5, que manteve a energia do som original, preservando inclusive o solo de gaita. Mas também não faz parte da lista das inéditas, foi lançada antes no EP de 2019.

“Hanging On By A Thread (Don't Give up”) é uma música que sai do contexto do disco, mas Alice resolveu incluí-la fazendo algumas alterações da versão original, lançada ano passado: A primeira versão é uma mensagem de força para todos nós devido a tudo que passamos (e continuamos passando) com a pandemia de COVID-19. A versão atual fala sobre um sistema de apoio para pessoas que pensam em suicídio.

Para encerrar o disco, as duas últimas faixas são: a malcriada “Shut Up And Rock”, que aborda a polarização que vivemos atualmente. A mensagem “cale a boca e detone” deve ser resultado do cansaço que sentimos a respeito de várias coisas, a começar pela intolerância que o mundo todo experiência. Afinal, a música, a dança e o Rock são capazes de unir as pessoas novamente. Alice Cooper acreditou nisso e criou a mensagem para se expressar, claro, à maneira dele.

Outro homenageado de Detroit foi Bob Seger, com o cover de “East Side Story'',e que também consta no EP “Breadcrumbs”. Mas para quem não conhece o som original, é melhor não se enganar: Você não vai ouvir um som regional , cheio de violões ou o que quer seja associado a um nome como “East Side Story” ou até mesmo com a figura de Bob Seger. A música é pesada, com refrão que lembra “Gloria” , com uma gravação fantástica de guitarras sustentando sua base. Ou seja, não fugiu muito da versão original, recomendo ouvir para fazer suas próprias comparações.

E se após ouvir o álbum inteiro alguém questionar sobre como um setentão pode fazer um trabalho assim tão debochado ou como ele pode ainda usar o Hard Rock como se décadas não tivessem passado, eu responderia para poupar o tempo perdido em questionamentos: Alice deu a base que criou e sustentou o Hard Rock , vindo de uma cidade de onde saía tudo (ou quase tudo) que era rejeitado como arte no restante do país, tendo como medidor de sucesso a galera do hospital psiquiátrico vizinho de onde a banda trabalhava.

E se depois de uma longa trajetória de hits e álbuns performáticos flertando com o fantástico, não poder gravar um disco de retrospectiva irreverente, maluco e despretensioso não faria sentido. E convenhamos: seja dentro do espectro da realidade ou do fantástico, Alice pode tudo.

Resenha Publicada em 11/03/2021





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