Resenha do Cd Tom Zé / Tom Zé

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TOM ZÉ
TOM ZÉ
1968

ROZENBLIT
Por Guilherme Cruz

Falar de Tom Zé é sempre difícil. Não é possível classifica-lo em nenhum gênero, estilo, movimento ou qualquer categoria que possamos criar. Inventivo a cada disco, Tom Zé se mantém como um incansável brincalhão de letras e arranjos. Caustico, irônico e por vezes divertido, ele cria a cada música um rumo novo em sua discografia, sem repetir formas e conceitos.

Baiano de coração paulistano, nada mais óbvio do que a primeira música de seu primeiro disco ser em homenagem à cidade que o acolheu. “São São Paulo” mostra um painel de paradoxos, fatos, alegorias e ironias sobre a grande cidade que não para. Tom olha para a metrópole e seus moradores sem tomar um lado, apenas canta o que vê e o que sente ao encarar São Paulo.

Se tivermos em mente que este disco foi lançado em 1968, ou seja, auge dos movimentos estudantis e artísticos contra a ditadura, a proposto da canção “Curso Intensivo de Boas Maneiras” torna-se clara. Esta música evidencia a ditadura como fruto das ideias imperante na época, exposto nos versos “Da nobre campanha/ contra o desleixo (...) Trazer o país/ Sob um regime intransigente”. Trazendo na música “Glória” o escancaramento da família conservadora que sustentou este mesmo regimo regime militar.

Num cenário de tédio e tradições “Namorinho de Portão” vai traçar o mundo dos jovens dessa geração. Desenhando os atritos que levaram às revoltas estudantis que explodiram no mundo todo. “Catecismo, Creme Dental e Eu” é uma música de composição imagética e de forte significado, onde o eu-lírico se insere dentro do que está acontecendo no país, se perdendo e se encontrando diante dos fatos que se desenrolam ao seu redor. Aqui ele descreve as características da ditadura em seu discurso demagógico no verso “Eu encontrei o benedito fruto em seus dentes” e a manutenção da ordem e da tradição pela força no trexo “Catecismo de fuzil”.

Dando sequência ao disco temos “Camelô”, música que evidencia a pobreza e a marginalização de camadas da sociedade, adicionando à sua crítica o imperialismo das potências que olham para países subdesenvolvidos como lugares para se ganhar dinheiro. Em seguida “Não Buzine que Eu Estou Paquerando” trata da velocidade cada vez maior com que o capitalismo obriga as pessoas a viver. Onde as coisas boas da vida, mostrada na expressão “paquerando”, acabam sendo deixadas de lado por conta dessa velocidade cada vez maior.

“Profissão de Ladrão” se desenrola no clássico problema do pobre ser sempre punido e o rico não. Em contraponto ao marginalizado, o disco segue com “Sem Entrada e Sem Saída”, nesta canção Tom Zé retoma sua crítica para com a sociedade moderna, evidenciando o impulso consumista, tão inerente ao capitalismo.

Ao nos mostrar um Brasil com sua mais berrante mentalidade de colônia, onde o brasileiro se sente anestesiado com a ideia de modernização, “Parque Industrial” explicita a crença cega de que apenas o dinheiro salva. Na era moderna tudo acaba sendo artificial e industrializado, “Pois temos o sorriso engarrafado/ Já vem pronto e tabelado/ É somente requentar/ E usar”.

“Quero Sambar Meu Bem” é uma música sobre a própria arte de Tom Zé, onde ele se coloca como alguém que não quer viver do passado, cultivando estéticas ultrapassadas. Mas não renega o que já foi, pelo contrário, as reutiliza, reinventando-as à luz de novas formas.

Por fim a ironia e a crítica velada é despida na canção “O Sabor da Burrice” trazendo à tona toda a estrutura corroída que imperava no Brasil dos anos 1960. “Veja que beleza/ Em diversas cores/ Veja que beleza/ Em vários sabores/ A burrice está na mesa”.

Esse primeiro disco se pauta na crítica a diversos aspectos da sociedade, desde a velocidade em que as pessoas passam a viver, até sua destruição pelo consumismo. Mostrando seus mais feios defeitos e mergulhando nas estruturas mais sujas do Brasil da década de 60, trazendo à tona a família e suas tradições, os atritos e as insatisfações dos jovens, até as disputas sociais entre ricos e pobres. Misturando isso tudo num retrato de um Brasil que festeja sua mentalidade colonial e o atraso cultural.

Resenha Publicada em 15/08/2016





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